(o
maior testamento que alguma vez publiquei aqui. Ou bem que escrevo ou
bem que não escrevo. E só lê quem quer, ora!)
Foi
há precisamente um ano. Um ano com um dia a mais. Passaram,
portanto, 366 dias. A minha vida mudou radicalmente. A qualidade
então nem se fala. Há um ano eu tomava, diariamente, medicação
para a diabetes e para a hipertensão. Era gorda, muito gorda. Hoje
não tenho problemas em dizê-lo: pesava 104 kgs. Tempos houve em que
pesei 112 kgs. Tinha vergonha de dizer estes números em voz alta.
Quanto mais escrevê-los. Os gordos têm vergonha de dizer o seu
peso. Eu tinha, sempre o assumi, e não dizia a ninguém. Dizia em
casa. Aos meus pais. E chegava. Mais ninguém precisava de ter
conhecimento desse número que me envergonhava, do qual me
envergonhava e que eu não conseguia combater apenas com alteração
dos hábitos alimentares e com a inclusão de desporto na minha vida.
Ah sabia também a minha Dra Patrícia que comigo travava a minha
luta contra a obesidade. A obesidade que teimava em perserguir-me e
em não largar-me, por mais que eu me esforçasse. A vida de um gordo
que quer perder peso, e não consegue, é complicada. Muito
complicada. Posso falar deste assunto com verdadeiro conhecimento de
causa. Porque é uma causa que conheço muito bem. Não foi uma luta
da vida inteira. Mas foi uma luta árdua e complicada dos últimos
vinte anos da minha vida. Tenho 45 logo é só fazer as contas, como
dizia o outro.
Verdade
seja dita que comer é algo de que gosto muito. Tenho a sorte de
viver numa família onde a Arte de bem cozinhar impera. E herdei esse
dom, o que não ajuda nada nestes processos. Contudo, as minhas
semanas eram passadas acompanhada de comida saudável com direito a
um disparate por semana. Unzinho apenas, nem mais nem menos. Nem eram
os doces, mas os salgados; aiiii, os salgados é que davam cabo de
mim. E neste estômagozinho cabia sempre mais um bocadinho. A minha
amiga SLR apelidava-me de “Paquita”, porque eu comia a minha dose
e ainda ia rapar as travessas dos outros. Impressionante, é verdade!
Agora brincamos e dizemos que “A Paquita morreu”.
Sim, ainda gosto de comer, no entanto nadfa das quantidades dos
antigamentes. Sim, a minha vida mudou, já o disse lá em cima.
Quando
surgiram as primeiras cirurgias bariátricas em Portugal eu quis logo
ser submetida a uma. E encontrei mais um um inimigo: as famosas e
horrorosas listas de espera. Passei por vários hospitais públicos
na esperança de que alguma equipa percebesse a gravidade do meu
caso. Não bastava ser obesa, mórbida, nos últimos 13/14 anos
surgiram também a hipertensão e a diabetes. Tudo associado o
excesso de peso. Portanto, como eu costumava dizer, eu era “uma
bomba com pernas” que a qualquer momento podia ter a bela da
entrevadinha e puf ou, com sorte, não puf mas viver com mais
reservas do que aquelas que já tinha. Daí que diariamente tomasse
um comprimido para cada uma das doenças silenciosas que me atacavam.
E nem assim conseguia contornar as listas de espera.
E
de lista de espera em lista de espera e de hospital em hospital andei
até me decidir ficar apenas pela consulta de nutrição, pela
atividade desportiva possível e aguardar os resultados. Mas num
corpo cujo metabolismo tudo retem, até o ar que se respira, a luta
era inglória e muito, muito complicada. Continuei a ter esperança
na operação e a viver a minha vida feliz e contente. Felizmente,
nunca me senti excluída da sociedade e nunca fui rejeitada por
ninguém por causa do meu peso. Felizmente, os meus amios sempre o
foram e nunca me descriminiram pelo meu peso. Felizmente nunca tive
problemas em ir à praia e em divertir-me. Felizmente, tive uma
família e uns amigos que sempre me trataram bem. Sei de casos e de
pessoas que se auto-excluíram da sociedade precisamente porque não
só não suportavam verem-se como eram, como ainda eram mal tratados
pelos outros e descriminados. Todos sabermos que a raça humanda é
cruel e má. Tive sorte ou soube rodear-me das pessoas certas, não
sei. Mas sempre fui feliz e isso é bom, muito bom.
Em
novembro/dezembro de 2014 tudo se alterou. Entregue a uma nova equipa
médica, num hospital privado, fui com uma carta do meu
endocrinologista à consulta de cirurgia geral, marcada anteriomente
pelo meu médico de família, e saí de lá com uma data. Qualquer
coisa de Fevereiro de 2015 seria a data em que tudo mudaria. Exames,
muitos, para a preparação foi o que se seguiu. E de repente, em
meados de janeiro de 2015 um telefonema: “Dona Blue, fala a
assistente do Dr. Y, a sua cirurgia terá de ser adiada porque o Dr
sofreu um acidente e vai ter de ser operado. Continue as preparações
todas, mas agora só a 26 de março poderá ser operada”. Ia
morrendo. A sério! Tanto anos à e em espera e um precalço quando
tudo ia tão bem encaminhado. Depois do choque inicial, o otimismo
voltou. Mais tempo para me despedir das comezainas e das festarolas
que o pós-operatório seria um mundo novo (mas essa descrição fica
para outro dia).
Portanto,
há um ano – 26 de março 2015 - pelas nove da manhã estava
numa cama de hospital prontinha e no aguardo para me levarem para o
cenário onde tudo aconteceria: a sala de operações. Foi lá que o
meu estômago ganhou um novo tamanho: mais pequeno e que a minha vida
começou a girar até aos 180º C a que hoje chegámos. O bypass
gástrico foi a melhor coisinha que me poderia ter acontecido nos
últimos tempos. O pós-operatório foi algo complicado, porque havia
muitas dores que suportei com a ajuda do meu grande amigo
Paracetamol. Nunca cedi ao comprimido de SOS para as dores e não foi
por bravura, foi sim porque, de facto, não precisei. Muitas dores,
mas suportáveis. O mais dífícil foi não comer sólidos durante
duas semanas. Só líquidos, numa primeira fase, e depois só papas.
Como os bebés comecei tudo de novo. Mas duas semanas após a
cirurgia disse adeus ao comprimido para a hipertensão e daqui a duas
semanas fará um ano que essa despedida foi feita para sempre, sem
direito a regressos. Este ano em janeiro disse bye bye ao
comprimido para a diabetes cujas doses diárias foram diminuindo ao
longo do último ano até ficarem nos mínimos para se transformarem
em adeus, ó vai-te embora e nunca mais voltes.
(fonte da imagem: net)
E
o peso perguntam vocês, pessoas de bem e interessadas neste
testamento? O peso foi descendo gradualmente que uma pessoa com um
estômago pequeno não consegue lá enfiar muita comida. Além disso
reeduquei-me alimentarmente falando e faço várias refeições por
dia, o que ajuda e muito neste processo. Voltei à minha natação e
até já gosto de fazer algumas caminhadas, sem exageros que não sou
uma sports person.
Ahhhh o peso: já lá vão praticamente 25 kgs com os quais nunca
mais me quero encontrar. Sinto-me saudável e continuo muito feliz.
Foi fundamental ter uns pais maravilha que me apoiaram desde o
primeiro minuto e que têm sido sempre, na vida em geral e sobretudo
neste processo, um suporte imprescindível para que tudo tenha
chegado a este bom porto e assim continue.
As
minhas amizades, aquelas que verdadeiramente interessam e me
interessam, também foram cinco estrelas e as palavras certas aliadas
à atitudes mais corretas têm sido incontáveis.
Uma
nota final para a maravilhosa equipa médica que me tem seguido e
acompanhado em todo este processo: o dr. João, o dr. Francisco, o
dr. Carlos e a dra. Mónica sem cujos os incentivos e conhecimentos
médicos eu não teria chegado aqui.
Outro
dia alguém me perguntava: “és o caso de sucesso dos teus
médicos?” e eu, orgulhosamente, respondi: “sou um dos e isso é
tão, mas tão bom que não há palavras que para exprimir o tamanho
da minha felicidade”.
Há
um ano a minha Páscoa foi em repouso e a líquidos e este ano vou
voltar ao belo do cabrito temperado e confecionado pelas fabulosas da
melhor mãe do mundo: a Minha. A Páscoa também foi um resuscitar
para mim. Para uma vida mais saudável, muito mais sustentável e
muito mais feliz.
Saudações
virtuais com votos de uma Santa Páscoa
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